Muito legal fazer uma reportagem com um ex-atleta que se acompanhou a carreira e anos depois estar com o próprio publicando um material.
Nessas horas, se diz o quão vale a pena ir atrás de suas metas.
crédito da foto: Arquivo pessoal |
Nesta sexta-feira, o FutNet segue seu especial entrevistando ex-jogadores que fizeram história no futebol.
O 'bola da vez' é o ex-atacante Sávio, revelado pelo Flamengo e com passagens por Real Madrid, Zaragoza, Seleção Brasileira, dentre outras equipes.
Atualmente o capixaba de Vila Velha está com 39 anos, vivendo em Florianópolis/SC. Na capital catarinense, possui negócios imobiliários, financeiros, além da Savio Soccer, que cuida da carreira de atletas (orienta tanto jovens e profissionais a ter uma boa carreira e como administrar o dinheiro que ganham) e ser um dos gestores do Guarani, de Palhoça/SC.
Nessa reportagem, Sávio Bortolini Pimentel, falou sobre o amor que sente pelo Flamengo e ao mesmo tempo criticou o clube que segundo o próprio, acumula más gestões atrás de más gestões. Falou da diferença entre atuar no Flamengo de 95 (que não deu certo no segundo semestre) e no Real Madrid (time cheio de estrelas e que deu certo no período que esteve por lá).
Também disse sobre o amor à primeira vista que teve com o Zaragoza e sua passagem pelo Anorthoshis Famagusta, onde pela primeira vez na história um time do Chipre se classificou para a fase de grupos da Liga dos Campeões da Europa (e quase foram às oitavas).
Confira
1)Conte um pouco da sua vida e como iniciou a carreira de futebol até chegar ao Flamengo.
Comecei em torno de 8 ou 9 anos jogando futebol em Vila Velha/ES, na minha cidade natal. Minha posição na época era ponta esquerda, como se diziam antigamente. Meu primeiro time foi o Fluminensinho, equipe fundada pelo meu pai, que é torcedor do Fluminense/RJ. Era um dos destaques daquela equipe, até que fui para a Desportiva, um dos times mais tradicionais do Espírito Santo. Por lá fiquei uns três anos e me destaquei em um torneio que chamava Copa A Gazentinha Internacional. Fomos campeões vencendo o River Plate-ARG. O Flamengo me viu jogando e me chamou para treinar no clube. Eu com 14 anos fui morar na Gávea.
2)Como foi a adaptação longe de casa, sendo outro estado e o período nas categorias de base do Flamengo?
No início foi muito difícil, bem diferente de hoje em dia. Eu fui para o Flamengo em 1988. Naquela época não existia computador nem celular. A minha família era muito unida e apegada. Sair de casa aos 14 anos não é fácil. Para me comunicar com meus familiares era só por telefone e daqueles de ficha, que eram caros. Ou seja, eu falava com meus pais duas vezes por semana e cinco minutos cada ligação!
Nas categorias de base sempre procurei me dedicar ao máximo. No meu primeiro ano fui campeão carioca infantil. No juvenil fui campeão estadual novamente e também nacional. Até que em 1992 subi para os profissionais e integrei o elenco que foi campeão brasileiro. Não cheguei a jogar, mas fiz parte daquele time. Em 1993, voltei para atuar nos juniores onde joguei o carioca e no segundo semestre voltei ao time profissional e não sai mais.
3) Fale um pouco sobre aquele time campeão de 1992, o seu convívio com jogadores mais velhos. Você se recorda quando foi seu primeiro gol como profissional?
Naquela época não era tão fácil subir ao profissional como hoje. Nos atuais clubes é comum ver jogadores de 17, 18 anos atuando no time de cima. Antigamente, não. Então, para um garoto como eu estar atuando ao lado de atletas experientes, como o goleiro Gilmar, o lateral-esquerdo Júnior, o zagueiro Wilson Gottardo,o meia Zinho, dentre outros, era muito gratificante. Creio que mais do que hoje. Fui bem recebido por todos e o respeito que tinham por mim era grande. Agradeço ao técnico Carlinhos por ter me dado essa oportunidade.
Meu primeiro gol no profissional, que eu considero foi em 1994, no quadrangular final do Campeonato Carioca, onde entrei no segundo tempo e fiz o último gol do Flamengo na vitória sobre o Fluminense por 3 a 1. A partir dali eu me firmei no time profissional.
1994 foi um muito bom para mim e ruim para o Flamengo. Foi onde eu me dei bem individualmente, sendo um dos artilheiros do Brasileirão. Já o Flamengo foi muito mal, um time muito jovem e que não fez boas campanhas. Foi um ano difícil para aquele time.
4) Em 1995 você fez dupla de ataque com Romário. Na época você um jovem atleta, enquanto o Baixinho era tetracampeão do mundo com a Seleção Brasileira e conhecido em todo o planeta. Depois veio o Edmundo. Como foi atuar com esses atletas e o que não deu certo neste time montado no centenário da equipe?
Na verdade no primeiro semestre o time foi bem sim. No começo era só eu e o Romário no ataque e o time deu certo. O problema é que perdemos o título carioca para o Fluminense por 3 a 2, com aquele gol de barriga do Renato Gaúcho e o revés foi tratado como um desastre.
O Flamengo que sempre teve dificuldade em montar uma boa diretoria e fazer uma boa gestão, resolveu mudar tudo. Trazendo, 4 ou 5 reforços de peso, um deles o Edmundo, como você mencionou. No entanto, o ego entre vários jogadores falou mais alto e não conseguimos montar um bom time. Pensaram primeiro em si, depois no Flamengo. Quando isso acontece nenhum time dá certo.
Mesmo assim chegamos na final da Supercopa (um extinto torneio sul-americano que reunia os campeões da Libertadores) e perdemos a final para o Independiente-ARG.
Sobre o Romário, atuei com ele até 1997 e nos demos muito bem. Esses tempos ele citou em uma entrevista que eu fui um dos melhores parceiros de ataque que ele já teve. Isso foi bem legal de saber.
5)Em 1996 o ano do Flamengo foi melhor e você ainda jogou as Olimpíadas. O que lembra daquela época e mesmo passado um bom tempo, por quê o Brasil perdeu aquela semifinal para a Nigéria?
Em 1996 a situação mudou na Gávea. Chegou Joel Santana e melhoramos, sendo campeão carioca invicto. Ainda ganhos uma Copa Ouro disputada em Manaus, onde batemos o São Paulo na decisão.
Naquele ano ainda fui campeão pré-olímpico com a Seleção Brasileira, onde vencemos a final na Argentina, contra a Argentina e isso foi muito legal.
Sobre a Olimpíada, ter perdido aquele jogo para a Nigéria por 4 a3, na prorrogação, são coisas do futebol. Acontecem.
6) 1997 foi seu último ano no Flamengo. Como você foi parar no Real Madrid?
1997 foi um ano bom, onde fomos vice-campeões da Copa do Brasil, perdendo a decisão para o Grêmio no saldo de gols. Naquela época não havia disputa de pênaltis. Fizemos um bom Brasileirão, terminando na terceira colocação.
Sobre o Real Madrid, nesta temporada já havia especulações de interesse deles, do La Corunã, do Valencia e de equipes da Itália no meu futebol. Dois meses antes de me transferir para o clube Merengue, o Flamengo foi à Espanha jogar dois torneios, o Palma de Mallorca e o Trofeo Naranja. Vencemos o Real Madrid e o Valencia, sendo eu um dos destaques. Depois a equipe da capital espanhola me fez uma proposta e fechamos o acordo.
7) Imagino que não deve ter sido fácil jogar no Real Madrid, um clube cheio de estrela e conhecido mundialmente.
Aí que você se engana! Eu quando fui pensava a mesma coisa e não é. Ao menos na minha época. Joguei ao lado de grandes jogadores como Hierro, Raúl, Zidane, Figo, Roberto Carlos, Ronaldo, Makelele e Seedorf, por exemplo. Os anos que fiquei lá foram especiais. Todo mundo se dava bem e não havia guerra de vaidades.Não foi a toa que ganhamos 3 Champions League (na primeira vez, o Real Madrid não vencia há 32 anos), 1 Mundial de Clubes em cima do Vasco, 1 Campeonato Espanhol e 1 Supercopa da Espanha.
Jogando no Real Madrid eu vi a diferença de pensamento com relação ao Flamengo de 1995. Os atletas do Real Madrid pensavam primeiro no time, depois neles. Naquele Flamengo era o contrário.
8)Um clube que você se deu muito bem foi no Zaragoza. Conte como foi sua passagem por lá?
Sim! Depois do Real Madrid, eu fui para o Bordeaux, da França, onde fiquei na temporada 2002/03. Foi muito boa a experiência lá. Depois recebi uma proposta do Zaragoza e aceitei, pois queria voltar a morar na Espanha. A minha relação com o time até hoje é muito forte. Foi amor à primeira vista. A expectativa da torcida era muito grande, pois sabiam do meu passado no Real Madrid. Eu consegui superar e hoje a torcida me adora. Fomos campeões da Copa do Rey da Espanha, da Supercopa da Espanha, além de um vice de outra Copa do Rey. No meu jogo de despedida, dei uma volta olímpica e toda a torcida me enalteceu. Bem emocionante!
9) O que acha da atual situação do time?
Fico triste em ver que o Zaragoza caiu para a segunda divisão. Infelizmente, a equipe vive nesses altos e baixos. Na minha época era um time mais forte, mais qualificado.
10)Saiu do Zaragoza em 2006 e veio para o Flamengo onde ficou um semestre. Como foi a volta' à casa'?
Não foi legal. Não fui bem recebido e alguns dirigentes do clube não me queriam lá. Aquele velho problema do Flamengo em não ter uma boa diretoria. Historicamente o clube sempre teve más gestões. Nos primeiros seis meses, recebi apenas salário de um. Tinha contrato de um ano e meio, mas fiquei apenas 6 meses e fui para a Real Sociedad. Joguei uma temporada e meia lá e acabei em 2008 me transferindo para o Chipre.
11)Foi bom ter ido jogar no Chipre? Um país pouco conhecido no Brasil
Cheguei no Anorthosis Famagusta com status de estrela. Lá eles adoram futebol e todo mundo sabia quem era o Sávio Bortolini (na Europa ele é conhecido também pelo seu sobrenome). Tive que jogar bem e mostrar para eles que estava lá para ajudar o clube e não para fazer turismo como se fosse um ex-jogador em atividade.
Mas a adaptação lá foi um pouco difícil. Quando mudo de país sempre procuro saber da cultura local que vou viver. Mesmo assim, aguentar o inverno rigoroso não foi fácil.
Na região onde eu vivia, eles falam grego e eu aprendi muito pouco sobre o idioma. Me comunicava em inglês com o técnico e havia atletas espanhóis, franceses e portugueses no elenco e com esses me comunicava melhor.
12)Dentro de campo como foi?
Foi muito bom, pois o Anorthosis foi o primeiro time do Chipre a disputar a fase de grupos da Liga dos Campeões da Europa! Caímos em uma chave com Inter de Milão-ITA, Werder Bremen-ALE e Panathinaikos-GRE. O grupo ficou equilibrado com os quatro times tendo condições de avançar às oitavas de final na última rodada. Nós enfrentaríamos na última rodada o Panathinaikos e se vencêssemos passávamos em primeiro na chave. Perdemos e ficamos em quarto lugar!
Obs: Naquela chave, o Panathinaikos terminou em primeiro lugar com 10 pontos, a Inter em segundo com 8, o Weder Bremen em terceir com 7 e o Anorthosis em último com 6. Nos seis jogos que cipriotas disputaram, foi uma vitória, três empates e duas derrotas.
13)Veio encerrar a carreira no Avaí. Como foi seu último ano de jogador e foi tranquilo ter que 'pendurar as chuteiras'?
Em 2010 vim para o Avaí, onde fui campeão catarinense. Mas no segundo semestre sofri duas lesões que atrapalharam minha sequência de jogos e não pude ajudar o clube na Série A do Brasileiro.
Ao término do ano vi que estava na hora de parar e investir em outras áreas. Escolhi morar em Florianópolis, pois a cidade é muito bonita, de fácil adaptação e dei início aos meus projetos.
14) Se sente realizado como jogador de futebol?
Totalmente. Vida de boleiro não é fácil, ver o que eu ralei e conquistei, não foi pouco. Os anos que passei no Flamengo e hoje ter uma torcida que me adora, é muito gratificante. Depois no Real Madrid os títulos que ganhei. Sinto que fui feliz em minha carreira.
15) Acredita que poderia ter tido mais chance na Seleção Brasileira?
Penso que sim. Em 1998 e 2002 acho que tinha condições de jogar uma Copa do Mundo. Estava bem. No entanto, a concorrência era muito grande naquela época e os treinadores optaram por outros atletas. Normal, respeito e entendo a opinião deles. Mas pela profissional cheguei a jogar amistosos e disputar uma Copa América. Isso me satisfaz.
16) De todos os times que atual, qual que você mais gostou e tem mais identificação?
Bom, o Flamengo considero a minha segunda casa. Adorei ter jogado no Real Madrid. No Zaragoza foi tudo muito intenso e muito bom. A experiência na Real Sociedad e no Chipre foram bem legais. Mas não posso negar que o time que ainda me identifico mais é com o Flamengo, por tudo que ele representa na minha vida!
17)Por fim, como você avalia o futebol brasileiro, de um modo geral, da época em que você começou a jogar e agora?
Melhorou em vários aspectos, mas ainda há o que fazer. É legal que hoje há mais cobertura da mídia. A televisão passa mais partidas e com a internet sabemos os resultados de vários jogos pelo Brasil.
O nosso calendário melhorou bastante. A adoção dos pontos corridos no Brasileirão foi muito boa. Eu gosto muito de jogar pontos corridos. Todo país precisa de um campeonato de pontos corridos e os mata-matas que serão feitos com a Copa do Brasil e os torneios internacionais.
Mas tem coisa para se fazer ainda. Primeiro os estaduais, que não tem o mesmo valor de antes. O ideal era desinchá-los, deixando com poucas equipes, mas boas. Mais qualidade nas equipes e menos quantidade. Menos datas. Também não podemos parar um Campeonato Brasileiro durante um mês por causa de uma Copa das Confederações. Precisa melhorar isso.
Por fim, os clubes mesmo precisa haver uma fiscalização maior em seus gastos. Há equipes que fazem dívidas, atrás de dívidas e nada acontece com os dirigentes. Eles seguem lá e os times ficam endividados. Isso não pode. Precisa ter um balanço financeiro melhor e punição rigorosa com quem não cuida do dinheiro do clube.
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