Embora, todos os Cantarelli do Brasil tenham uma origem única, houve um espalhamento durante a imigração. Boa parte se concentrou no Sul e uma outra em Pernambuco. Uma minoria se instalou Brasil afora.
A família do ex-arqueiro rubro-negro é de Além Paraíba/MG, enquanto a minha vem do Rio Grande do Sul. Logo, o parentesco é bem distante.
Um outro fator comum com este sobrenome é sobre como se escreve. É com 2 'Eles (LL)'? Um só? Termina com E ou I?
O original é com 2 'Eles (LL)' e termina com I. Mas, alguns no Brasil, acabaram sendo registrados de forma errônea. Um desses foi Antônio Luis Cantarele. Na imprensa , o sobrenome do ex-goleiro foi escrito de diversas formas e segundo o próprio, é com 1 'L'e termina com E.
"O meu nome foi registrado errado. Antigamente era comum o escrivão não conhecer outra língua e acabava escrevendo de forma errada. Eu sou o filho mais velho dos meus pais e os meus outros 4 irmãos, tem o sobrenome Cantarelli registrado da forma correta. Só o meu que não", disse o ex-goleiro em entrevista exclusiva para este blog.
Cantarele afirmou não saber exatamente qual a localidade da Itália que vieram seus bisavós (e seu avô quando era criança), mas acredita que tenha sido da Calábria. Fixaram residência em Além Paraíba, um município na divisa entre os estados do Rio de Janeiro e Minas Gerais.
Como muitas famílias brasileiras em meados do século passado, a vida era humilde e na roça. Cantarele estudava e gostava de jogar futebol. Escolheu o gol, por causa do Manga (ex-Botafogo, Inter e Seleção Brasileira), seu primeiro ídolo.
Naquele período, em que estudava no Senai pela manhã, treinava a tarde e a noite fazia o ginásio, o até então, jovem de 15 anos nunca imaginou que um dia moraria no Rio de Janeiro/RJ e jogaria em um clube grande como o Flamengo.
Até que uma partida entre dois times juvenis mudou o rumo de sua vida.
" Era uma partida na minha cidade. Eu estava com 15 anos e havia 2 olheiros do Rio. Um trabalhava para o Vasco e o outro para o Flamengo e também para o Botafogo. Inicialmente me levaram para fazer teste no Botafogo, mas lá acabaram não ficando comigo, pois alegaram que eu era muito novo. No ano seguinte, o mesmo olheiro me levou para o Flamengo. Era um período de férias escolares, aí fiquei treinando e se não desse certo eu retornava para casa. No entanto, gostaram de mim e eu fiquei. Queria aproveitar a oportunidade", relembrou o ex-atleta nascido em 26/09/1953.
Como curiosidade, quem foi levado para fazer testes no mesmo período, mas no Vasco, e era conterrâneo de Cantarele, foi o goleiro Mazzaropi. Este faria história no Gigante da Colina e posteriormente no Grêmio/RS.
Cantarele fez parte de uma geração que seria a mais vencedora da história do Flamengo. Na base conviveu com futuros ídolos, como Júnior, Zico e Rondinelli.
A sua estreia no profissional, foi no Campeonato Carioca de 1973, diante do América. Vitória Rubro-Negra por 1 a 0. Na ocasião, a jovem promessa substituiria o goleiro Renato que estava a serviço da Seleção Brasileira.
Cantarele em seus tempos de goleiro do Flamengo |
Em 1975, Renato acabou se transferindo para o rival Fluminense e Cantarele teve a primeira oportunidade como titular. Permaneceu até 1977 na meta, até que chegou Raul Plasmann e assumiu o posto. Esse time que viria a ser comandado por Cláudio Coutinho e com vários atletas formados na Gávea faturaria 3 Campeonatos Brasileiros (1980,82 e 83) e 1 Libertadores e 1 Mundial em 1981.
"Era uma geração vencedora e que gostava do Flamengo.Um time identificado com o clube, diferente de hoje, onde muitos jogadores beijam escudos de equipes, mas não a amam de verdade. Aquela equipe amava o Flamengo", relembrou o ex-goleiro.
Equipe do Flamengo campeã da Libertadores e do mundo em 1981 |
Cantarele acabou não participando da conquista do Brasileiro de 83, pois nesta temporada atuou por empréstimo ao Náutico. Por lá, acabou sendo vice-campeão estadual.
"Foi uma experiência boa e diferente. Morar em outro estado, outra região e atuar por um clube diferente. Fomos vice-campeões pernambucanos. Perdemos o título nos pênaltis para o Santa Cruz", contou.
Ao retornar em 84, Raul havia deixado o clube, mas chegou o argentino Fillol, titular da Argentina na conquista da Copa do Mundo de 1978.
" Com o Fillol houve uma disputa boa pela titularidade. Eu a ganhei em 1985, mas acabei lesionando o joelho em uma partida contra o Bangu em 1986. Fiquei um ano parado. Quando retornei,o Zé Carlos era o titular e não saiu mais. Fiquei até 1989 e depois resolvi me aposentar", relembrou.
Cantarele tem 557 jogos pelo Flamengo e é o goleiro que mais vezes vestiu a camisa rubro-negra. Além dos títulos nacionais e internacionais acima, houve cinco conquistas estaduais (1974,78,79,81 e 86). Está entre os 10 atletas que mais jogaram pela Gávea. O ex-arqueiro ainda menciona que os torcedores, que o viram atuar, hoje quando o reconhecem o cumprimentam pela história que construiu.
"Aproveitei a oportunidade que a vida me deu. Jogar em um clube tão importante do Brasil e por tanto tempo.Mais de 500 jogos como titular. O torcedor daquela época quando me vê na rua, me cumprimenta, felicita e relembra aqueles bons tempos. Isso é bacana. Os mais novos, infelizmente não me conhecem, mas faz parte," comentou.
Como curiosidade, Cantarele atuou uma vez pela Seleção Brasileira, em 1976. Foi em um amistoso não-oficial,no Maracanã. O rival foi um combinado de jogadores de todo o mundo. Vitória brasileira por 3 a 1. Entretanto, o próprio afirmou não ter muitas recordações dessa partida
Após pendurar as luvas, Cantarele cursou educação física no Centro de Capacitação Física do Exercito, na Urca e começou a trabalhar em outras áreas do futebol. Inicialmente, participou de peneiras, onde era um dos avaliadores. Um nome que apareceu dentre tantos, que foi aprovado por ele, foi do Ronaldo Fenômeno, que viria a ser um dos maiores jogadores da história do futebol.
"Eu vi o Ronaldo atuando e o aprovei. Entretanto, o Flamengo não quis ficar com ele. Na época, eu não soube o motivo que fez com ele não ficasse no clube. Tempos depois, vi entrevista dele dizendo que ele morava muito longe do CT do Flamengo e a diretoria não quis custear o trajeto de ida e volta", contou.
Em 1991, Cantarele recebeu o convite do ex-atacante Amarildo, para ser treinador de goleiros do Al-Ain nos Emirados Árabes Unidos. O ex-arqueiro ficou no país asiático durante 2 anos.
"Foi muito boa a experiência no Emirados Árabes Unidos. Al-Ain era uma cidade pequena, universitária e agradável. Nosso goleiro era um cara muito alto, que agarrava bem, mas mal sabia bater tiro de meta. Precisava de umas aulas. Eu gosto de trabalhar com jogadores jovens e que gostam de aprender. Trabalhar com profissional é diferente, pois, não tem a mesma mentalidade de alguém que está nas categorias de base", continuou.
Ao retornar ao Brasil, se tornou preparador de goleiros do Flamengo. Em sua primeira passagem nessa função, trabalhou com nomes como Gilmar ( ex-Inter, São Paulo e Seleção Brasileira) e Roger, que passou também por São Paulo e Santos.
Ainda passou por Corinthians e Palmeiras, tendo trabalhado com dois pentacampeões do mundo com a Seleção Brasileira: Dida e Marcos.
No Japão, trabalhou no Kashima Anthlers e depois, a convite de Zico, foi o preparador de goleiros da Seleção da Terra do Sol Nascente na Copa do Mundo de 2006.
"Adorei a minha passagem pelo Japão. Pude passar muito do meu conhecimento para eles. Ensinei eles a cair e não se machucar,a antever uma jogada e forçar o atacante a fazer o que ele não quer, evitando assim um gol. De início eu tinha um intérprete que me ajudava na comunicação e um dos goleiros havia morado em São Paulo/SP e sabia português. Conforme o tempo passou, eu aprendi o básico da língua japonesa: o que era necessário para o dia a dia e para os treinamentos. Fica bem mais fácil para passar instrução ao jogador", contou.
Em 2010, trabalhou novamente no Flamengo e passaram pela sua mão nomes como Marcelo Lomba e Paulo Victor, hoje, respectivamente, no Internacional e no Grêmio.
Trabalhando como auxiliar-técnico no Flamengo |
Entre 2013 e 14, foi auxiliar-técnico do clube carioca, quando Jayme de Almeida foi o comandante. Ganharam uma Copa do Brasil.
Depois se desligou do clube e hoje vive como aposentado e eventualmente ajuda amigos que possuem escolinhas e clubes de futebol a encontrar e peneirar talentos.
Vivendo e trabalhando com goleiros desde os anos 60, Cantarele falou sobre as diferença que houve na função de baixo das traves.
"Penso que é a posição que mais evoluiu no futebol. Hoje há muito mais estrutura de treinos para goleiros e uma preparação melhor do que no passado. Atualmente, o goleiro tem muito mais funções em campo. Goleiros hoje iniciam jogadas e atuam frequentemente com os pés, diferente do passado, onde usavam apenas as mãos. Em cruzamento na área, os goleiros hoje socam a bola para frente para seguir o jogo. Antigamente, a recomendação era agarrar a bola.Não saíam socando como fazem hoje. Sem contar que o gramado é melhor, a bola mais leve e não encharca em dias de chuva. A chuteira também era mais pesada. No entanto, acho que antigamente os goleiros, pela realidade que viviam, tinham mais intuição e isso se perdeu com a evolução dos treinos e materiais", opinou.
Cantarele segue acompanhando o Flamengo e se mostrou muito feliz com o trabalho que Jorge Jesus vem realizando. Desde a chegada do treinador português, o Rubro-Negro conquistou a Libertadores e o Brasileirão de 2019. Em 2020, já faturou a Recopa do Brasil, da Sul-Americana e o primeiro turno do Campeonato Carioca.
"Gosto muito de ver o Flamengo de Jorge Jesus jogar. E digo mais: antes da chegada do português, o Brasil não tinha aprendido nada com a derrota de 7 a 1 para a Alemanha na Copa de 2014. Precisou um técnico europeu por um estilo de futebol moderno no nosso país. Depois daquela derrota na Copa, não abrimos os olhos para que tipo de futebol ainda estávamos praticando", finalizou.
Crédito das imagens: Divulgação/Internet
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